terça-feira, março 15, 2005
Um Casa no Fim do Mundo, M. Cunningham (I)
Por vezes continua a ser difícil distinguir entre o que aconteceu e o que podia ter acontecido.
Por uns momentos esforçamo-nos por subir no ar, (…), uma fracção de centímetro. Doce glória. É nisto que reside o segredo do voo – temos de o fazer imediatamente, antes que o nosso corpo compreenda que está a desafiar as leis.
Março. Depois do degelo. Atravesso o cemitério a pensar na minha vida infinita.
Continua a tentar superar o hábito de esperar pouco da vida.
Sempre acreditei que é possível chegar ao conhecimento através do bluff.
Passaram-se anos – agora vivemos no futuro, que é muito diferente do que tínhamos planeado.
Os mortos são só pessoas que quiseram as mesmas coisas que tu e eu queremos.
Foi outra lição no processo continuo da minha aprendizagem: como qualquer outra prática ilegal, o amor entre rapazes deve ser tratado como uma trivialidade.
Gostava de pensar que podia mudar a minha vida sem abrir mão das pequenas verdades do dia a dia.
Aos treze anos tomamos demasiadas opções sem pensar nas consequências e no modo como podem arrastar-se pelas décadas.
A fé é para a gente nova. Já li tudo o que havia para ler. Já não sou bonita.
É isto que fazemos. Tentamos construir um futuro a partir das matérias-primas disponíveis.
Não éramos amantes, mas quase. Ocupávamos a esfera superior do amor, onde as pessoas acarinham a companhia e excentricidades umas das outras, onde se querem bem.
A diferença entre os vinte e cinco e os trinta e seis anos é que aos vinte e cinco anos não conseguimos ter um ar patético. A juventude permite-nos tudo. Podemos vestir qualquer coisa, fazer seja o que for ao cabelo, sem deixar de ter um aspecto perfeitamente aceitável. Ainda estamos a tentar definir-nos, por isso não há problema. Mas há medida que os anos passam, começamos a ser atraiçoados pelas nossas ilusões.
Não estava seguro daquilo que sentia e não queria que me pedissem para dar um nome a esses sentimentos. Talvez temesse, ao descreve-los tão prematuramente, esgotar-lhes o potencial para o crescimento e a mudança. Talvez tivesse razão.
Neste mundo não conhecemos necessariamente as pessoas. Principalmente se nos deixarmos distrair pela música e pela passagem das horas.
Ocorreu-me que a morte podia ser uma forma mais remota de participação na história continua do mundo.
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